Comunidade do Instituto Cristovão Colombo

Aqui os membros da comunidade do Orkut podem tudo!!! Vamos relembrar os bons e os não tão bons tempos!!! Postem fotos à vontade!!!

Saturday, November 26, 2005

Beatles, estrelas & serragem


Estive lá, quase não acredito. Acho que foi o ano 64, 65. Não sei. Sentíamos uma nova e estranha onda, as mensagens nos chegavam em garrafas, despertavam uma euforia inexplicável Admirável mundo novo aquele que se anunciava.

Lembro-me das descidas ao pátio no intervelo das aulas, pela manhã, onde convivíamos com os alunos do externato - uma zuada de crianças correndo e comendo. Uma convivência digamos... desejante. Eles nos traziam notícias do front - uma revista com a foto do John Lennon, ou um brucutu, uma calça saint-tropez... Que era aquilo, meu Deus, que era aquilo que anunciava um novo tempo? Eu me aboletava nos cubos de ferro e desejava os acepipes dessa legião quase-estrangeira. Como o mundo era estranho lá fora... mas como o desejava! Ele nos vinha como ondas intermitentes.

Numa daquelas tardes eternas - essa luz dourada ainda tarda na memória - lembro-me de que os alunos atearam fogo numa planta e excitados diziam, "é peido de velha, é peido de velha"... e todos nos púnhamos a rir deliciosa e despreocupadamente. Éramos livres... Isto é, mais ou menos; sempre nos rondava a ameçava da visita compulsória ao grande-dormitório-grande onde nos esperava, depois das orações de praxe, o velho Molhão.

Não é incrível que só agora, muito recentemente, vim a descobrir que o santo nome do Molhão era León? Irmão Leão = Mo Leão = Molhão. O velho leão rugia e se assentava ao trono de vime solenemente, com pompa e circunstância, a batina desbotada mas digna, o discreto sinal clerical no pescoço, repartindo a justiça e distribuindo as bênçãos de um domingo eterno que ainda embala a molecada ruidosa e travessa que habita minha memória.

Aquele pó de estrelas douradas, vermelhas, amarelas, ocres, polvilhadas pelo chão de ladrilhos vermelhos, de onde vinha? A serragem úmida penetrava as narinas tenras do menino e encardia a alma com uma fragrância indelével. Quantas vezes não empunhei heroicamente uma vassoura levando adiante aquele pó de estrelas castanhas?

Por falar em estrelas, havia um telecópio. Eu não me lembro quem o trazia de alguma sala misteriosa, instalava o instrumento, ajustava, mirava, focava e nos oferecia o espetáculo do firmamento. Acho que era o Padre Pedro Zamberlan. Estranho objeto! A noite nos cobria com seu manto de mistérios. As estrelas, tão distantes, que segredos guardavam? Via à direita o cruzeiro iluminado por uma covarde luminiscência. Quantas vezes não pedíamos que o Padre Pedro desviasse o foco para lá, para resdecobrir as formas conhecidas da torre, tornadas estrangeiras pela luz fugidia; à esquerda advinhavámos o galpão e suas oficinas abrigados pelo manto da dama noturna. E fazíamos fila, os olhos arregalados, as pupilas dilatadas, nervosas como tímidas dançarinas.

Assim como as estrelas eram arrancadas de seu caldo escurecido, tragadas por aquele instrumento poderoso, assim éramos arremesados a um mar de aventuras arcaicas, embalados num carrossel de galáxias espiraladas e luzes fugidias.

Ah! essas estrelas meus filhos ainda as vêem em meus olhos!

Saturday, November 19, 2005

DIA DE VISITA



Dia de visita era uma festa!!! Minha mãe levava algumas coisas que gostávamos, como sucrilhos, balas Juquinha, lanches Mirabel!!! Na foto, eu e meu irmão Nilson!

Sérgio Jacomino said....Por um fio....

ESSE TAMBÉM!!!


Sérgio Jacomino said....
Por um fio...

O ICC era uma microcosmo, um continente encravado num ponto qualquer do Ipiranga, entre a barroca - soberana, única, indisputada referência! - um seminário carlista misterioso, enovelado em ondas de roseiras, rosários e rostos de figuras tristes, limitado pelos altos muros que nos separavam de uma terra incógnita. Como os marujos grafaram em suas cartas marítimas: "hic sunt leonis!"

Pois havia ali, perdido no quadrante localizado entre lavanderias, refeitório e cozinha, um espaço místico, habitado por duendes, coelhos, fadas, pássaros e uma infinidade de pequenas e delicadas plantas que vicejavam à sombra de um arvoredo.

Abel reinava em seus domínios: cidadela fortificada de madeira, guarnecida por galinhas, porcos e cachorros, fazendo costada com o prédio dos dormitórios.

Lembro-me que certa noite, tomado pelo medo, atormentado pela solidão e ferido por um sentimento que jamais me abandonaria - a perda do calor materno - caí em um transe profundo, como se estivesse me esvaindo, perdendo completamente o sentido de mim mesmo.

Havia ao lado da cama um armarinho de madeira, onde minha roupa e alguns poucos pertences - a pasta de dentes, a escova, o par de sapatos Verlon - ainda confirmavam minha existência. As coisas clamam por seu dono! E só isto me bastaria para me recobrar e aí resistir, com minhas pequenas propriedades. Tão cedo compreendia que a propriedade tem, ela mesma, certas propriedades...

Tinha nos bolsos da calça um carretel de linha corrente e rapidamente, antes que me esvaísse novamente em transes e ondas de medo, engastei a pasta de dentes no fio da linha e fiz descer pela janela esse estranho pedido de socorro. E ali fiquei, imóvel, ligado ao exterior por um tênue fio de linha corrente, experimentando que o mundo pesava exatamente o peso de um tubo de pasta de dentes.

Lá fora os cães ladravam na noite perturbadora. Eram as feras de Abel. À porta assomava um vulto escuro, cuja silhueta se conformava pela luz tíbia que preguiçosamente lambia os ladrilhos. Quem seria? Quem me visitava na noite?

E assim adormeci, com a certeza de que enfim despertava de um pesadelo!

SJ

6:48 PM

SERGIO said...

ESSE COMENTÁRIO DO COLEGA SÉRGIO MERECE SER UM POST!!!

SERGIO: said...
Parece que eu inauguro os comentários.

Ok! Começo com uma história incrível. Vivi-a no ICC. Pena que não me recorde do nome dos envolvidos.

Mas não importa. Foi assim... em algum momento daquele tempo - agora uma dimensão perdida da memória, um profundo vale que parece não ter início nem fim -, comecei a participar do coral.

Havia me esforçado esganiçando-me nas fileiras que se faziam para o exercício vocal e para a escolha dos melhores (ou menos piores, pode ser também).

Havia algumas vantagens em fazer parte do coral - como ensaiar nas horas das aulas, por exemplo.

Muito bem, um dia, depois de vários ensaios (eu fazia a segunda voz), fomos todos à frente do Instituto para receber uma autoridade religiosa que além de trazer a sua aura inconsúltil de autoridade, traria também medalhinhas do Papa. Suponho que voltasse de Roma.

Estávamos à frente da entrada principal, esperando a sua chegada, quando alguém nos avisou que lá do alto, nas alturas aeronáuticas e azuladas, de dentro do avião, nossa autoridade teria saudado aqueles meninos ansiosos por sua chegada. Sim! Ele nos teria mandado um sinal, uma marca, enfim, uma prova inequívoca de seu carinho: a autoridade cuspiu! Havia nos mandado uma saraivada de saliva da aeronave e todos nós começaríamos a procurar as provas de tão importante demonstração de amor.

Ah! como nos esvaíamos em delírios e fantasias esperando em pé numa tarde modorrenta de verão. Voávamos muito além de Roma, Nairóbi, passando pela Barroca, resvalando os sinos de uma igreja, superando os eucaliptos desta e de outras paragens.

Essa história é adornada com as roseiras que ainda perfumam minhas tenras lembranças infantis.

O ICC foi uma viagem, com tudo de apavorante, triste, deslumbrante, e definitivo que uma verdadeira viagem proporciona.

Volto um dia com as lembranças de outros dias.

Abraços

5:45 PM